terça-feira, 6 de abril de 2010

Os dias foram passando e passando até que dei conta que faltava uma semana para voar. Começei a tentar organizar as coisas que iria levar comigo. Pensei em tudo que fizesse com que a mente ficasse ocupada durante a viagem. No fundo sabia que porventura não iria usar as coisas que levaria, mas ao fazê-lo também estruturava mais na minha cabeça que a viagem seria inevitável e que seria algo que no final trazer-me-ia um enorme prazer. Voar iria implicar conhecer uma nova cidade e sítios diferentes, bem como ultrapassar mais uma barreira na minha mente. E bem que estava a precisar de testar o que até então tinha vindo a trabalhar. Pois bem, decidi levar comigo um livro de Eckhart Tolle que na altura estava a iniciar, umas folhas A4 em branco, uma caneta e o livro de Madrid da American Express emprestado pelo meu caro amigo e vizinho André. Durante essa semana senti-me algo agitado interiormente; por momentos imaginava como seria a viagem ao pormenor, mas de pronto tomava consciência disso mesmo, abraçava essas emoções e deixava o pensamento fluir sem deixar rasto.
Na ante-véspera, ou algo assim do género, da minha viagem, tive um jantar com o meu grande amigo João Maurício no qual tivemos uma breve conversa acerca do assunto. Da mesma guardo a seguinte frase: "Puto mas tu sabes que nada vai acontecer, não é?" E riu-se de seguida. Esta passagem de confiança é algo que nunca irei esquecer. Um dia abandonarei este corpo e com ele partem todas as imagens de vivências, sendo esta demonstração de amizade e transmissão de confiança uma das que certamente irei conservar até esse momento subtil, o da despedida que não tem necessariamente de ser mau.
Na manhã do voo acordei bem cedo para estar com duas horas de antecedência no aeroporto. Tive tempo para uma última breve meditação antes de sair de casa.
Recordo-me de estar no aeroporto a sensivelmente uma hora e meia do voo, de mochila às costas e com a bagagem de mão. Não era uma bagagem de mão qualquer, era a que a minha mão suportava com vigor e expectativa; a mochila tocava-me os ombros suavemente e concedia-me uma coragem adicional que por palavras não conseguirei explicar. "Bom dia, é um chá de camomila, por favor." E assim estava eu prestes a embarcar e a aproveitar o magnífico aroma do chá. Dizem que faz bem para acalmar. Ainda tive tempo para mais uma dose de chá. Decidi então dirigir-me para a porta de embarque e quando apresento o bilhete, sou informado que o meu voo foi cancelado e que portanto passaria para daí a duas horas. Enfim, que mais me poderia acontecer?
Tive de esperar na sala com alguns passageiros nas mesmas condições que eu. Calhou mesmo em má altura pois a tripulação da TAP estava em greve. Sucederam-se alguns telefonemas, especialmente para a minha mãe. A conversa normal que qualquer pessoa teria em semelhantes condições. O grave seria perder duas horas em Portugal, porque só iria ficar em Madrid por uma noite. Teria assim ainda menos tempo para ver alguma coisa da cidade. Via os aviões à minha frente e tentava ambientar-me ao barulho dos motores.
Enfim, a hora finalmente chegara; finalmente porque dentro de mim havia agora um misto de expectativa, medo, vontade e alegria. Só queria chegar a Madrid. Apresentei o bilhete, dirigi-me para o autocarro e sentei-me. Aproveitei para abordar a revista de bicicletas que tinha comprado na zona de tax-free do aeroporto e começei a folheá-la enquanto esperava que o autocarro enchesse. Começei a sentir uma ligeira agitação mas de pronto disse para o meu corpo de dor: não vale a pena isso agora, eu vou para Madrid. Ainda tive tempo para um último telefonema para a minha mãe enquanto saia do autocarro em direcção às escadas que subiam até à porta do avião. Gostaria de me recordar do nome do avião!

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