sábado, 7 de novembro de 2009

Naquele dia especial senti um misto de vazio e determinação. Dei por mim a descer a calçada da Alameda Henriques Dom Afonso, e o que eu mais desejava era perceber o que se passava realmente comigo. Embora fosse só uma sombra que me vigiasse as costas, eu não ia sozinho. A pressão na cabeça lá me acompanhava como sempre tinha a amabilidade de fazer. Não me recordo de ter sentido explosões corporais devido à nova experiência que estava prestes a "viver", mas lembro-me sim de que tinha plena convicção do que representava aquela bela tarde na capital. A porta de ferro estava pintada de verde escuro e por ela, certamente, já passara muitas pessoas, muitos egos desejosos de controlar cada vez mais a mente do hospedeiro. No interior do prédio vislumbrei um elevador à antiga, com aquela grade vistosa e barulhenta. O trinco abriu-se e eu entrei. Lá dentro encontrei uma rapariga. Sentei-me e esperei pelo momento. Na minha cabeça deambulavam pensamentos do género: "Como será a Daniela?", "Que tipo de espaço será?". Tudo naquela divisão da casa apelava a um sentimento de paz e relaxamento. Peguei numa revista que por ali habitava e passado poucos minutos surge a Daniela. "Ângelo?"

O espaço da consulta era pequeno, a cadeira super confortável posicionava-me fulminantemente em direcção à Daniela. Desconhecia o que estava por detrás de mim, contudo conseguia ver um pátio, um pouco baldio, com árvores ao meu lado esquerdo. Senti-me ligeiramente apertado, mas ao mesmo tempo confortável, pois o espaço sugeria um certo isolamento do mundo. Ali eu deveria ser capaz de abrir o meu coração e revelar os meus problemas. O momento tinha chegado e eu estava ali, sentado, diante de uma pessoa que acabara de conhecer e para a qual iria revelar-me. Estranho, não? Sim, estranho. Começámos a falar sobre o que me levava a recorrer à psicoterapia e o que eu esperava das consultas. A pressão na cabeça continuava presente enquanto debitava palavras boca fora e tentava expressar a minha tristeza e angústia. No entanto, de certeza que o sorriso que mantinha na cara não convencia a Daniela de que eu só precisava de uma ajudinha e que no fundo "eu não tinha quase nada". Tratava-se de uma defesa do corpo; eu não queria mostrar fraqueza nem inferioridade. Para mim ir a uma consulta de psicoterapia sempre me fez confusão porque eu era bastante céptico em relação à psicologia e à forma como, apenas a partir do diálogo, alguém conseguia mudar a sua personalidade e ultrapassar problemas pessoais. Fui sincero em tudo que lhe transmiti, mas não consegui deixar de ter consciência da voz na minha mente sempre a tentar controlar o que iria dizer. É mesmo impressionante este fenómeno. É a voz do ego, no fundo. É deveras importante ser-se sincero no que se transmite à pessoa que nos está a estender a mão.

Cada minuto da consulta foi sentido e, curiosamente, aquela uma hora levou uma eternidade a passar. Expor as nossas fraquezas é muito complicado mesmo, mas já estava feito. O primeiro passo foi tomado. Saí do edifício com um sentimento diferente de todos aqueles que tinha vindo então a sentir desde há meses e meses atrás. Não bom, mas diferente. A promessa de voltar daí a duas semanas ficou gravada naquela caixinha interna a que chamamos: desejo!

Tenho imensos pormenores a referir, mas que considero pertinentes num estado mais avançado da minha descrição das consultas.


Com amor.

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